Ilustríssimos, 2021
Das tantas miradas às mais de 12mil fotografias que guardo do arquivo público de Belo Horizonte, que datam entre as décadas de 1950 e 1970, por muito tempo me chamou a atenção um tipo de imagem recorrente: a presença de crianças em acontecimentos políticos, seja na prefeitura ou em eventos externos, em inaugurações, celebrações, visitas, assinaturas de leis, entre outras solenidades. Presença esta que, historicamente, serve bem a uma “humanização” dos senhores governantes, à politicagem.
Esse acervo - não diferente de outros tantos arquivos oficiais - constituído, catalogado e preservado em prol de uma cidade em constante “progresso”, coloca em evidência certos sujeitos (poucos são nomeados nas fotografias de arquivo) e certos acontecimentos. Quase não se vê registros de manifestações populares, e de quase nenhuma se tem registro sem a presença ilustre de algum governante –, sendo predominantes as fotografias de obras públicas e acontecimentos políticos de naturezas diversas. Das tantas miradas às mais de doze mil fotografias que compõem o arquivo, utilizando-as como fonte para pesquisas diversas, ao longo de muitos anos, começa a me chamar a atenção uma presença que não faz pose, desatenta quando quer e muitas vezes atenta ao que ninguém parece notar, assumidamente – e comicamente – entediada ou curiosa; uma presença que não participa ativamente da politicagem que a faz ilustre.
As crianças estão dentro da prefeitura ou em ambientes externos, em inaugurações, celebrações diversas, visitas de obras, assinaturas de leis, entre outras solenidades. Elas não estão no centro da narrativa, como em outros momentos da construção da história do país (como a icônica imagem em que Deodoro da Fonseca, primeiro presidente do país, carrega no colo a “menina república”, ou a cartilha “Getúlio Vargas, o amigo das crianças”, publicada pelo DIP, em 1940, no intuito de afirmar o carinho consagrado às crianças pelo outro então presidente, que associava o destino da infância, ao destino do país). Talvez por essa mesma razão, de serem uma presença que preenche o espaço, mas não protagonizam a cena, é que ocupam tão bem o papel de romper com a austeridade das solenidades.
Decido, então, destacá-las. Destacar essa presença sutil, mas cheia de agência. Destacar, também, a recorrência dessa presença, que é até hoje usada pela propaganda política. O jogo de luz inverte a posição ilustre, ressaltando um jogo outro, que segue em disputa: o político. A iluminação cenográfica enfatiza a teatralidade já característica das cenas registradas, mas as crianças emprestadas não entram no jogo das cerimônias e relações cordiais, não se comportam como os demais e não costumam estar atentas ao que protagoniza os eventos.
PUBLICAÇÃO - Prêmio Photothings 2023
Fotos: Maria Vaz
Textos: Ioana Mallo, Maria Vaz e Marly Porto
Projeto gráfico: Alyssa Ohno
Tradução: Cello Sawczuk
Português e inglês
Peso: 0.3 kg
Dimensões: 15 × 19 cm
Encadernação: brochura
40 páginas
Editora: Porto de Cultura
ISBN: 978-65-85769-00-6
1ª Edição
Tiragem: 50 exemplares
Ano: 2023, São Paulo (Brasil)
EXPOSIÇÕES:
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2024 - Salão Anapolino de Artes - Anápoles, GO
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2024 - Salão de Artes de Itajaí, SC
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2024 - Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger - Salvador, BA